Na minha época não tinha celular na escola, mas…

Tenho visto muitas pessoas comentando sobre essa nova lei que proíbe celulares nas escolas. Parece que, de repente, essa medida vai transformar as crianças em seres super comunicativos, que vão interagir entre si no intervalo, socializar espontaneamente e até brincar mais. Mas, honestamente, será que é assim tão simples?

Essa discussão me fez lembrar de uma parte da minha vida que nunca gostei: a escola. Para mim, a escola foi um período de sobrevivência, não de diversão. Como introvertida, sofri muito com a obrigação de ser social o tempo todo. Eu não era do tipo que fazia amizades facilmente, e minha única amiga na escola era alguém que também preferia ficar desenhando em vez de interagir com os outros. Nós duas passávamos os intervalos com a cabeça baixa, rabiscando cadernos, enquanto o resto da turma brincava.

A educação física era um verdadeiro pesadelo. Jogar em equipe? Interagir com os colegas? Eu detestava. Sempre errava os passes porque não gostava de olhar para as pessoas. Até a sexta série, consegui sobreviver como goleira, porque focava apenas na bola e não precisava me preocupar com a dinâmica social do jogo. Mas quando começamos a jogar vôlei, tudo piorou. Eu era péssima, não acertava um saque, errava todas as jogadas e, claro, virei motivo de chacota. A humilhação de ser sempre a última a ser escolhida para os times era constante. Até que um dia, chorei na frente do professor e ele finalmente entendeu que aquilo era uma tortura para mim. A partir dali, passei a fazer trabalhos teóricos sobre músculos e ossos, enquanto assistia às aulas da arquibancada.

Mas a pressão social não ficava restrita às aulas de educação física. No terceiro colegial, tivemos uma disciplina de sociologia, onde precisávamos desenvolver um projeto social. E lá estava eu, sendo forçada mais uma vez a interagir com um grupo de desconhecidos. Tentei argumentar com o professor, dizendo que eu preferia ajudar financeiramente ou de outra forma, mas sem precisar falar com ninguém. Não funcionou. Fui obrigada a participar e, no processo, chorei várias vezes. Fui parar na diretoria por me recusar a interagir. Minha mãe insistiu que eu continuasse, sem compreender o quanto aquilo me fazia mal. Eu não tive apoio na minha introversão durante a escola, e isso tornou toda essa fase ainda mais difícil.

Hoje, continuo sendo introvertida. Quando chego a um lugar novo, prefiro ficar sozinha. Mas, com o tempo, encontrei maneiras de me expressar sem precisar do contato social direto. As redes sociais, por exemplo, me ajudaram muito. Consigo gravar vídeos, escrever textos e até estou fazendo aulas de teatro para entender melhor minha relação com a comunicação. Não é timidez. É introversão misturada com uma certa ansiedade social.

E é exatamente por isso que eu questiono tanto essa ideia de que a proibição dos celulares vai, de alguma forma, “consertar” os alunos e torná-los mais sociáveis. Quando eu era criança, não existiam celulares, e eu me refugiava na biblioteca. Enquanto os outros conversavam no intervalo, eu preferia ler. Isso nunca mudou. Hoje, ainda escolho um livro ao invés de uma balada ou um bar. E acredito que essa imposição social da escola só me fez reforçar ainda mais minha necessidade de me proteger desse ambiente forçado.

Agora, com quase 40 anos, percebo que consigo interagir melhor do que antes. Mas esse foi um processo natural, e não algo imposto. Então, será mesmo que a proibição do celular vai transformar os alunos introvertidos? Ou isso só vai criar novos gatilhos para uma geração inteira de crianças que simplesmente não querem ou não precisam dessa interação forçada?

Conversar com colegas que não tinham nada em comum comigo era uma tortura. Falo disso até hoje na terapia. A escola não precisava ter sido uma experiência tão horrível se tivessem tido mais empatia com a minha característica. Até parece que há algo errado em ser ‘quieto’, como se precisássemos ser ‘consertados’. 

Não estou dizendo que a proibição é ruim. Para os alunos extrovertidos, talvez isso traga benefícios. Mas e para os introvertidos? Eles realmente são minoria? Essa é a dúvida que fica.

Vivy Corral

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