Egoísta, eu?

De repente, ser introvertido virou problema. Quer dizer… “de repente” é modo de dizer. Aparentemente, desde que o mundo é mundo, ser introvertido sempre foi aquele defeitinho básico que precisa ser corrigido com interações humanas forçadas, um pouco de small talk e talvez um retiro espiritual com dinâmicas em grupo.

Lembrando: eu sou millennial. Aquela geração que nasceu antes da internet e foi jogada dentro dela sem manual. A mesma geração que cresceu ouvindo que precisava dividir brinquedo, abraçar a tia com bafo de vinho e fazer amizade com os primos escrotos só porque “é de família”. Então assim, ser introvertido nos anos 90 não era só estranho, era quase um sinal de doença.

Mas veja bem, não é que a vida melhorou. Agora que somos adultos, as redes sociais e o mercado de trabalho decidiram que só os extrovertidos merecem o troféu de funcionalidade. Os introvertidos? Ah, esses sumiram. Só aparecem se forem gênios ou se criarem uma start-up revolucionária em silêncio.

Agora, por que esse chilique introvertido no meu blog pessoal hoje? Porque, veja bem, este blog é meu. E hoje eu acordei com vontade de falar do meu umbigo. Com orgulho.

Desde criança, sou acusada de egoísmo. “Não gosta de dividir”, “não fala com as pessoas”, “vive no mundo dela”. Minha mãe, inclusive, até hoje me chama de insuportável — o que, honestamente, depois de anos de análise, eu aceitei como um elogio. O insuportável, às vezes, é apenas o que não se molda.

Vamos a um exemplo prático: o carro (que nem é meu, é emprestado). Eu deixo abastecido porque trabalho na rua e acordo 5h da manhã. Planejamento, sabe? Só que minha mãe resolve pegar o carro, não abastece de volta, e quando eu percebo, estou atrasada e sem tempo pra parar no posto. Quando reclamo, sou egoísta. Não é pelo valor da gasolina — é pela quebra de expectativa. Pela logística cuidadosamente construída e destruída com um “ué, mas é só gasolina”.

E isso se repete com comida, lanche, barrinhas de proteína (sagradas!). Eu compro uma pra cada dia. Uma. E escondo. Porque eu sei que se eu deixar à mostra, alguém vai comer achando que é “só uma barrinha” e aí lá estou eu, tendo que ir ao mercado e interagir com caixas, filas e promoções de Yakult. TORTURA.

É sobre isso, Brasil. Não é egoísmo, é autossustentação. Não é individualismo, é manutenção da sanidade. Não é falta de afeto, é gerenciamento de energia social.

Mas claro, para o mundo que valoriza quem grita mais alto na reunião e quem faz amizade no elevador, eu continuo sendo a egoísta. A insuportável. A que esconde comida e quer gasolina sempre no mesmo nível.

Pois bem, me deixem com minha gasolina, minhas barrinhas escondidas e minha gloriosa solitude. 

Assinado: a egoísta de coração bom, com a agenda milimetricamente programada para não precisar sair de casa mais do que o necessário.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  • Deneme Bonusu Veren Siteler
  • Betpas
  • Restbet
  • Zegnabet
  • Restbet
  • Bethand
  • Restbet