A confiança se veste bem. Ela tem um padrão estético que não pode ser desafiado. A primeira vez que me olharam com desconfiança foi dentro de uma farmácia. Eu estudava em uma das escolas mais prestigiadas da minha cidade, onde só estudavam filhos de políticos, artistas, pessoas de prestígio que estavam na mídia. Mas eu nunca gostei de me vestir com roupas de marca. Enquanto minhas colegas desfilavam com botas de mil reais, eu sempre preferi o conforto: uma calça jeans, uma camiseta, um tênis que me levasse por caminhadas de horas e horas, onde eu pudesse desestressar uma mente que vivia, e ainda vive, muito ansiosa.
Em um desses dias, entrei em uma farmácia, e a fila estava gigantesca. Era a hora do almoço, e todas as pessoas dos escritórios tinham descido de seus prédios para resolver as coisas que precisavam durante o dia. Foi nesse momento que senti uma súbita dor de cabeça e parei na farmácia para comprar um analgésico. Enquanto esperava na fila, pensei em adiantar o meu lado e pegar o dinheiro na carteira. Assim que abri minha bolsa, entre corredores abarrotados de chocolates, balas, sabonetes cheirosos e perfumes estrategicamente posicionados para fazer as pessoas consumirem mais, um segurança se aproximou.
Ele não me disse absolutamente nada. Apenas se abaixou, pegou um shampoo e, disfarçadamente, olhou dentro da minha bolsa para ver se eu não estava colocando nada dentro. Confesso que, como ainda era adolescente, demorei um pouco para entender o que tinha acontecido. Mas aquele sentimento de suspeita me atingiu em cheio: ele achou que eu estava fazendo algo errado.
A segunda vez que me olharam com desconfiança veio de pessoas que já me conheciam. Eu estava na escola, durante uma prova para a qual tinha estudado muito, desesperada por uma boa nota. De repente, alguém colocou um bilhete na minha carteira. Apesar de eu saber todas as respostas, aquele bilhete foi o suficiente para que a professora acreditasse que eu estava colando. A sorte foi grande de não ter a minha prova zerada.
A terceira vez foi na faculdade. Fazendo um trabalho em grupo, enviei a minha parte escrita para uma colega por e-mail. Ela namorava um cara da nossa sala, e ele simplesmente abriu o e-mail dela, roubou o nosso trabalho e entregou como sendo dele. Um grupo de cinco rapazes entregou exatamente o mesmo trabalho que o nosso, e, por algum motivo, a professora acreditou que nós tínhamos copiado deles. Meu ego foi ao chão. Como assim? Meninas precisam copiar trabalhos de meninos? Não é óbvio que é o contrário? Só depois de ameaças de término de relacionamento, o rapaz admitiu para a professora que tinha roubado o trabalho.
A história se repetiu na pós-graduação, quando uma colega me pediu ajuda com um trabalho. Confiante, mandei um rascunho para ela, já propositalmente com algumas frases em vermelho para que entendesse o objetivo. Ela simplesmente tirou as partes em vermelho, colocou o nome dela, e entregou. Mais uma vez, a professora acreditou que eu havia copiado.
Esses episódios me lembram da infância, quando minha irmã mais nova, percebendo que bastava fabricar uma prova para que eu fosse punida, se arranhava até o braço ficar vermelho, quase sangrando, e corria chorando para a mamãe, dizendo que eu não queria emprestar os brinquedos. Com 7 ou 8 anos, olhava aquele bracinho ferido e sabia que não tinha argumentos. Aceitava a surra que vinha, sem palavras para me defender.
Parece que essa falta de confiança me acompanha pela vida. O ápice veio quando, já adulta, minha psicóloga pediu comprovantes de pagamento, dizendo que estava mudando de contador. Após meses enviando os comprovantes, ela mencionou casualmente que outra paciente chamada Vivi estava com pagamentos atrasados. E eu pensei: Poxa, a minha psicóloga, depois de anos de tratamento, acredita que sou eu a paciente caloteira? O que tem em mim que não é confiável?
Quantas vezes mais a sociedade vai bater em mim, acreditando que sou uma golpista vivendo uma vida que não mereço? O que faz uma pessoa confiável? O que eu faço para aparentar não ser?