A cadeira da frente está vazia

Sobre aniversários, desencontros e a liberdade de estar sozinha

Hoje é meu aniversário de 40 anos.
E eu vim jantar sozinha.

Não porque não tenho com quem, mas porque cansei de esperar.
Cansei de implorar atenção, de criar expectativa.
Cansei de fazer parte de relações em que sou sempre quem se desloca, quem organiza, quem insiste.

Esperei companhia pra tomar um drinque por muitos anos.
Na verdade, esperei tanto que acabei nem indo. Porque as pessoas não apareciam.

Moro numa cidade próxima de São Paulo, mas a logística — o trânsito, a falta de transporte público, o cansaço — sempre faz com que a escolha mais prática para os outros seja que eu vá até eles. Sempre foi assim. Desde a infância. Meus amigos eram de São Paulo. Eu, do interior.
A lógica era: se você quer ver a gente, venha.

Mesmo quando eu estudava no colégio perto de casa e tinha amigos por perto, os aniversários já eram momentos difíceis. Eu me arrumava, deixava tudo pronto, cheia de ansiedade boa — mas eles não vinham.
Apareciam minhas tias, meus avós… mas nunca meus amigos.

Minha mãe, até hoje, me chama de “insuportável”.
Talvez por não aceitar calada, por não ter aprendido a ser aquela pessoa que deixa passar.
Mas, ainda assim, mesmo com essa fama de difícil, eu continuei tentando.
Até parar.

Aos 18, decidi que faria um aniversário só para amigos.
Marquei numa balada em São Paulo, me desloquei por horas, me esforcei ao máximo para viver só um momento meu.
Mas enfiei meu pai numa crise — ele não tinha sido convidado, porque eu queria algo diferente. Queria uma festa sem censura, sem vergonha, sem frases constrangedoras.
Foi a primeira vez que percebi que, pra mim, não dava pra misturar amigos e família.

E não era só questão de vibe — era respeito mesmo.

Um dia, já adulta, convidei um casal de amigos homoafetivos pra jantar em casa. Antes deles chegarem, dei um esporro no meu pai, pedi educação, pedi o mínimo.
Ele cumprimentou, tudo bem.
Mas depois que eles foram embora, mandou minha mãe lavar com Cândida todos os copos, talheres e pratos que eles usaram.
Senti um nó na garganta. Culpa. Raiva.
Vergonha de ter exposto meus amigos àquilo.
E mais uma vez, minha mãe limpando a sujeira alheia — inclusive a emocional.
Depois disso, decidi: nunca mais levo ninguém pra casa. Ponto.

Aí eu casei. Achei que finalmente teria liberdade pra escolher meus amigos, minhas visitas, meus afetos.
Mas não.
Meu ex era problemático em todos os sentidos. 
E cá estou: de volta à casa dos meus pais. Com uma filha pra criar.
Com a sensação de que o tempo passou… e a solitude ficou.

E mais um aniversário chegou.
E de novo, pensei: “quem eu posso chamar?”
E de novo, pensei: “e se cancelarem na véspera?”
E aí eu desisti.

Hoje, no dia em que completo 40 anos, decidi fazer algo diferente:
Me vesti com a roupa que eu queria usar há tempos.
Fiz uma maquiagem bonita.
E vim. Sozinha.
A um restaurantinho japonês que eu estava adiando há meses.

É individualismo?
É.
Mas também é autocuidado.
É autoproteção.
É amor-próprio.

A verdade é que a sociedade me decepcionou tantas vezes que demorou pra eu aprender a estar bem comigo mesma.
A gostar da minha própria presença.
A curtir o meu silêncio.

Até quando eu vou me privar de um sushi só porque a cadeira da frente está vazia?

Se sou sempre eu quem se desloca, quem se esforça, quem organiza…
E ninguém faz o mesmo por mim — nem no meu aniversário — será que esse vínculo vale a pena?

Talvez não.
Talvez o que eu precisava era só isso aqui:
Um jantar tranquilo.
Uma mesa para um.
E o direito de me amar sem plateia.

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